Desmistificando a lenda de uma alma imortal

11 de agosto de 2013

A Bíblia e as experiências fora do corpo


Experiências fora do corpo – Alguns imortalistas citam a experiência de Paulo revelada aos coríntios para tentarem provar de alguma maneira que existe uma alma imortal presa dentro do nosso corpo. Veremos tal citação: “É necessário que eu continue a gloriar-me com isso. Ainda que eu não ganhe nada com isso, passarei às visões e revelações do Senhor. Conheço um homem em Cristo que há catorze anos foi arrebatado ao terceiro céu. Se foi no corpo ou fora do corpo, não sei; Deus o sabe” (cf. 2Co.12:1,2).

Para eles, a alma de Paulo se desligou temporariamente do corpo rumando ao Céu a fim de ter as revelações. Tal interpretação, contudo, carece de respaldo teológico. Em primeiro lugar, porque a experiência que Paulo teve se deu enquanto este estava em vida, e não depois de morto. A doutrina da mortalidade da alma prega que não existe vida entre a morte e a ressurreição, sendo, portanto, a morte a cessação total de existência consciente. Como a experiência de Paulo se deu enquanto este ainda estava com vida, segue-se que não contraria os princípios teológicos da doutrina mortalista.

Em segundo lugar, não é nos dito que Paulo foi na forma de uma “alma imortal” para o Paraíso. Ele afirma que foi “no corpo ou fora dele”; e não “no corpo ou na alma”. Em toda a citação deste acontecimento não há qualquer citação de alma-psiquê ou de espírito-pneuma, mas apenas de corpo-soma. Paulo não queria confundir os seus leitores e, por isso, nem sequer faz qualquer menção de “alma” ou “espírito” em tal experiência.

Estar fora do corpo não significa, na visão holista paulina, estar na forma de um espírito descorpóreo (se fosse assim então ele faria menção da possibilidade de partida da alma na experiência, o que não é nos dito). Significa apenas que ele poderia estar fisicamente no Paraíso (“no corpo”), ou tendo um quadro mental do Paraíso (“fora” do corpo). Isso explica o porquê de Paulo falar claramente em “visões e revelações” no verso 1, porque ele sabia da possibilidade daquilo ter se tratado apenas de uma visão, o que não é algo real em si mesmo (cf. At.12:9).

Neste caso, não seria o seu próprio corpo que lá estaria, pois ele [Paulo] estaria na terra e tendo uma visão [arrebatamento de sentidos] do Paraíso. O apóstolo Pedro nos afirma que uma visão não é necessariamente algo que esteja acontecendo de fato no devido momento como um acontecimento físico: “Pedro, saindo, seguia-o, e não sabia que era real o que se fazia por meio do anjo, mas julgava que era uma visão” (cf. At.12:9).

Vemos, portanto, que a dúvida de Paulo não se baseava na suposição de estar no Céu como alma ou como corpo, mas sim de estar literalmente no Céu (corporavelmente) ou de estar tendo uma visão como se lá estivesse (v.1), o que seria considerado “fora do corpo”, porque o corpo estaria na terra enquanto passava-se a visão e as revelações, e não porque a alma teria partido.

Concorda também com isso todo o ensinamento bíblico acerca de arrebatamentos, pois a Bíblia nunca nos mostra qualquer caso de qualquer profeta do AT ou de qualquer pessoa que tenha visto a partida da alma para ter a experiência. Essa nunca é a linguagem bíblica empregada por eles, porque eles não acreditavam na visão dualista da natureza humana. Por isso, em absolutamente nunca a alma-psyque/nephesh é referida em qualquer experiência de qualquer pessoa, mas tão somente fazem eles questão de mencionar uma visão (revelação), em um arrebatamento de sentidos em que eles se viam em determinado lugar.

Vemos, por exemplo, a narração da experiência de Ezequiel: “Enquanto ele falava, o Espírito entrou em mim e me pôs de pé, e ouvi aquele que me falava” (cf. Ez.2:2). Não é nos dito que foi o espírito do próprio profeta que deixou o corpo na experiência, mas sim o Espírito de Deus que temporariamente entrou nele a fim de lhe capacitar a receber de Deus aquilo que Ele lhe havia dado. A mesma linguagem é expressa várias vezes pelo profeta:

“No quinto dia do sexto mês do sexto ano do exílio, eu e as autoridades de Judá estávamos sentados em minha casa quando a mão do Soberano Senhor veio ali sobre mim (cf. Ezequias 8:1)

“Então o Espírito me ergueu e me levou para a porta do templo do Senhor, que dá para o oriente. Ali, à entrada da porta, havia vinte e cinco homens, e vi entre eles Jazanias, filho de Azur, e Pelatias, filho de Benaia, líderes do povo” (cf. Ezequias 11:1)

“Então o Espírito de Deus ergueu-me e levou-me aos que estavam exilados na Babilônia, na visão dada pelo Espírito de Deus” (cf. Ezequias 11:24)

Veja que não é o espírito do profeta que deixa o corpo, mas sim o Espírito de Deus que espiritualmente lhe erga a fim de ele ter uma visão de determinado local. É exatamente isso também o que aconteceu com João no Apocalipse: “Imediatamente me vi tomado pelo Espírito, e diante de mim estava um trono no céu e nele estava assentado alguém” (cf. Ap.4:2), e é essa também a ideia expressa pelo apóstolo Paulo em 1Cor.12:1,2. Sumariando, quando Paulo menciona que foi “arrebatado” nesta experiência, ele está falando de visões proféticas, como diz de modo claro o verso 1.

Os profetas tinham a sensação de estarem em outros lugares quando estavam tendo as visões (cf. Ez.11:24; Ap.1:10); mas essa de Paulo, em especial, ele não sabia se estava de fato naquele lugar (se fosse assim necessariamente estaria no corpo), ou se estava lá em uma visão, tendo um arrebatamento de sentidos em que se viu no Paraíso. Algo semelhante aconteceu com Pedro:

“Estando eu orando na cidade de Jope, tive, num arrebatamento dos sentidos, uma visão; via um vaso, como um grande lençol que descia do céu e vinha até junto de mim” (cf. Atos 11:5)

O que acontece é um arrebatamento de sentidos – que é considerado como sendo uma “visão” – e não uma “alma imortal” deixando temporariamente o corpo ou um "espírito" se desligando da prisão do corpo e habitando em outro lugar, ao maior estilo kardecista de ensino. Tal linguagem é extremamente estranha à luz da Bíblia, simplesmente porque o dualismo grego não se encaixa nas Escrituras.

Todos os apóstolos e profetas sabiam muito bem que o que lhes sucedia não era um espírito deixando o corpo e muito menos uma alma imortal que se desligava da matéria, mas sim um arrebatamento de sentidos em que se viam em determinado lugar. A razão pela qual eles jamais afirmaram que as suas “almas” deixaram o corpo provém do fato evidente de que eles não acreditavam no dualismo entre corpo e alma pregado entre os gregos.

Por Cristo e por Seu Reino,
Lucas Banzoli (apologiacrista.com)

Extraído de meu livro:  "A Lenda da Imortalidade da Alma"


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20 comentários:

  1. Irmão, quando você cita apocalipse 4:2, gostaria de saber qual tradução você está usando, interessante que no grego não diz que ele foi arrebatado em espírito, mas levado no espírito.Eu entendo que não tem nada a ver com desencarnação do espírito como defendem os pentecostais.

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  2. Olá, Gilvan, eu também entendo o texto desta maneira, não há nenhuma desencarnação ali. A versão que eu usei no artigo traz a palavra "tomado" pelo Espírito, e não "arrebatado" em espírito. Tomado tem o mesmo sentido de levado. Abraços.

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  3. No texto grego não diz que ele foi arrebatado em espírito, mas que ele foi levado no espírito, ἐγενόμην ἐν Πνεύματι Ap 1:10 egenómen en Pneumati = fui no espírito, Eu creio que assim como os profetas da primeira aliança, ele foi levado pelo poder do espírito de Deus a ter as visões que teve, pois senão não faria sentido ele como espírito desincorporado vendo almas desencarnadas debaixo do altar?! kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

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  4. Oi! Eu dei uma olhada nesse Blog procurando algo sobre o arrebatamento e não consegui encontrar. Você escreveu alguma coisa a esse respeito? Ah! Muito obrigada por publicar textos tão esclarecedores!

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  5. Olá Camila, sobre arrebatamento eu escrevo em meu outro blog (esse aqui é só sobre imortalidade da alma), veja estes artigos:

    http://apologiacrista.com/o-arrebatamento-e-pre-ou-pos-tribulacional

    http://apologiacrista.com/cristaos-passarao-pela-tribulacao

    http://apologiacrista.com/deixados-para-tras

    http://apologiacrista.com/pre-tribulacionismo-pais-da-igreja

    http://apologiacrista.com/refutando-pre-tribulacionismo

    Abraços!

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  6. O autor do texto entende que essa passagem bíblica claramente faz alusão a VISÕES E REVELAÇÕES e que, portanto, a narrativa de Paulo dizendo que CONHECEU UM HOMEM que havia quatorze anos fora arrebatado ao terceiro e ao paraíso pode e deve ser compreendida como referência a OUTRO HOMEM e não ELE PRÓPRIO?

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  7. Eu entendo que Paulo estava falando de si mesmo. Veja que no verso 1 ele diz:

    "É necessário que eu continue a gloriar-me com isso. Ainda que eu não ganhe nada com isso, passarei às visões e revelações do Senhor" (2 Coríntios 12:1)

    E depois, no verso 6:

    "Mesmo que eu preferisse gloriar-me não seria insensato, porque estaria falando a verdade. Evito fazer isso para que ninguém pense a meu respeito mais do que em mim vê ou de mim ouve" (2 Coríntios 12:6)

    O sentido aqui transmitido é que Paulo recebeu uma revelação extraordinária da parte de Deus, razão pela qual Deus enviou um espinho na carne para que ele não se vangloriasse com as grandezas dessas revelações.

    Abraços!

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  8. Eu, francamente, penso que o texto bíblico de II Cor 12 é de imensa clareza no que diz respeito à narrativa do homem chamado Paulo. Nesse sentido, vejo como IMPOSSÍVEL interpretar ou entender que Paulo, ao fazer referência a "UM HOMEM" estaria falando de si mesmo, embora isso omitindo por uma questão de "MODÉSTIA" ou de "HUMILDADE" ou por não querer GLORIAR-SE ou VANGLORIAR-SE. A meu ver, na Bíblia ou no campo Espiritual não há espaço para "protocolos de discursos", para expressões que sirvam como amenização do "EU", com a finalidade de expressar uma espécie de autodesprendimento, como ocorre, por exemplo, em pronunciamentos solenes (discursos) feitos por pessoas ou autoridades quando normalmente troca-se o "EU" por "NÓS". A passagem em questão mostra-se de inconfundível compreensão, na medida em que Paulo declara cristalinamente que, POR VISÃO ou REVELAÇÃO, conheceu UM HOMEM, um DETERMINADO HOMEM, e que ESSE HOMEM fora arrebatado ao terceiro céu e ao paraíso e, lá, O MESMO HOMEM ouvira palavras inefáveis.
    Imagine-se, por exemplo, o Apóstolo João, no Livro de Apocalipse, capítulo 1, versículo 10, procurando expressar humildade ou modéstia ou desapego a vanglórias e, em vez de dizer que “Eu fui arrebatado no Espírito no dia do Senhor”, apregoasse que “UM CERTO HOMEM” fora tomado pelo Espírito do Senhor...
    A Bíblia contém TAMBÉM narrativas de ARREBATAMENTOS inequívocos, como o de ENOQUE e o de ELIAS. Esses foram e NÃO MAIS VOLTARAM.

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  9. Qual o sentido de SE vangloriar por uma visão que nem foi dele? Isso seria o mesmo que eu me vangloriar pelo fato do pastor Fulano ter tido uma visão espiritual ou arrebatamento. Não tem sentido.

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  10. O sentido é o sentido BÍBLICO, isto é, em conformidade com a NARRATIVA BÍBLICA. E o que está escrito na Bíblia? Que Paulo fora contemplado ou privilegiado com uma VISÃO ou uma REVELAÇÃO de Deus (II Cor 12:1). Penso ser indubitável que REVELAÇÕES ou VISÕES provindas de Deus para QUALQUER vivente seja um inadjetivável privilégio que pode abrir ensejo a um justo GLORIAR-SE. Você modificou o sentido do texto bíblico, ao exemplificar dizendo: "Isso seria o mesmo que eu me vangloriar pelo fato do pastor Fulano ter tido uma visão...". Não foi DECIDIDAMENTE isso o que aconteceu. Paulo poderia vangloriar-se não porque o "pastor Fulano" teve uma visão ou revelação, mas porque ELE, PAULO, TEVE A VISÃO OU REVELAÇÃO!!!

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  11. E o que eu estou dizendo este tempo todo? Que Paulo teve a visão.

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  12. O exemplo que você postou para ilustrar seu ponto de vista contraria frontalmente o texto bíblico: "...Isso seria o mesmo que eu me vangloriar pelo fato do pastor Fulano ter tido uma visão espiritual ou arrebatamento...

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  13. Foi Paulo ou não foi Paulo quem teve a visão? Decida-se de uma vez.

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  14. Caro Lucas Banzoli: Fui suficientemente claro nos comentários que fiz acerca dessa passagem bíblica de II Coríntios 12. Todavia, ao que estou percebendo, você parece não se sentir confortável com minhas manifestações. Por isso, deixo-o à vontade.

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  15. Você começou dizendo que este homem que teve essas visões e revelações não era Paulo. Depois disse que era. Sou eu que devo explicações?

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  16. Apenas para encerrar: Você está completamente equivocado. Eu disse exatamente o que a Bíblia diz, ou seja, que PAULO (Paulo) FORA PRESENTEADO COM VISÕES OU REVELAÇÕES A PARTIR DAS QUAIS ele conheceu um OUTRO homem que, POR SUA VEZ, havia sido ARREBATADO até o terceiro céu e até o paraíso. TUDO ISSO EM PERFEITA SINTONIA COM O MEU SEGUNDO COMENTÁRIO.
    Obrigado.

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  17. Acho que essa questão acerca de a quem se tratava a pessoa da visão é apenas um detalhe, mas acredito que realmente essa pessoa era Paulo, pois depois de ele haver dito que a pessoa da visão fora arrebatado ao paraíso e que ouviu palavras que digamos eram misteriosas, ele disse no versículo 5: De alguém assim me gloriarei eu, mas de mim mesmo não me gloriarei, senão nas minhas fraquezas. Ou seja, é possível que ele tenha dito que se gloriou como consequência não apenas pela visão, mas também por causa da honra recebida pelo homem na visão, dando a possível ideia de que a glória daquele homem também era dele, de Paulo. Ainda mais nesse versículo, Paulo disse que não se gloriaria dele mesmo com as suas próprias mãos, mas que apenas tinha a glória dessa visão como consequência, mas como Paulo se gloriaria com as suas próprias mãos nesse caso? no versículo 6 ele disse: Porque, se quiser gloriar-me, não serei néscio, porque direi a verdade; mas deixo isto, para que ninguém cuide de mim mais do que em mim vê ou de mim ouve. Ou seja, Paulo se gloriaria a si mesmo se caso falasse a verdade(entrando em mais detalhes), dando a possibilidade do leitor imaginar que a forma pela qual ele entraria em detalhes ou falasse a verdade era se ele dissesse que a pessoa da visão era ele mesmo, Paulo. só mais um detalhe: nesse capítulo da bíblia ou escritura não tem lá dizendo que Paulo conheceu a pessoa da visão só após a visão, entretanto disse que conhece a pessoa sem falar quem era e sem detalhar se já conhecia antes ou não, conclusão: É possível sim imaginar que Paulo estivesse falando dele mesmo.

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  18. o nosso Deus nao nos confudem,pois o proprio Espito testifica o nosso esprito em concordancia.E realmente o texto e claro,quando ele fala a respeito de si mesmo e nao de outra pessoa. A minha biblia esta de acordo com a do lucas,na mesma traducao,no texto de AP 1.10 e 4.2 mais tem gente que faz comentarios na sua interpretacao e confudem outros que estao lendo,por isso e preciso da direcao do ESPIRITO SANTO. AMEM MEUS QUERIDOS fiquem na paz.

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